E chegando aos 200 inscritos no Seminário: “DIREITO À SAÚDE: O SUS ESTÁ EM RISCO?"
Seminário debateu os Desafios atuais da gestão da saúde
O pensamento crítico de Amélia Cohn, Luis Eugenio Souza e
Gastão Wagner, na primeira Mesa-redonda do Seminário 'A gestão da Saúde
no Brasil'.
A primeira Mesa-redonda do Seminário Preparatório para o
11º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva
trouxe as opiniões de Amélia Cohn, Gastão Wagner e Luis Eugenio Souza
sobre os ‘desafios atuais da gestão da saúde’. Sob a coordenação de
Fernando Monti – secretário municipal de Bauru, que foi nomeado em
janeiro como novo presidente do Conselho Nacional de Secretarias
Municipais de Saúde (Conasems), a professora Amélia Cohn obteve a
atenção ininterrupta do público com uma apresentação bastante original
“retomei meus estudos sobre a reforma sanitária brasileira e me pergunto
por que o SUS em 1988 era o príncipe da reforma social e hoje ele se
transformou num sapo – sem ter uma princesa que lhe ponha um alfinete na
cabeça!” começou Amélia em sua comunicação. A professora questionou o
público sobre qual a diferença do SUS da década de 80 e agora e
respondeu de pronto: É que o movimento da reforma sanitária que resultou
no SUS ocorreu no seio de uma efervescência da sociedade onde tínhamos a
emergência de partidos e setores organizados da sociedade, com
propostas e concepções diferentes de como avançar nas conquistas sociais
– das quais a proposta do SUS se beneficiou.
Amélia partiu então para um exemplo que deixou a plateia bastante
participativa “vendo ontem a novela, (e alguns podem se perguntar mas
por que Amélia estava vendo a novela? Ora estava vendo porque eu gosto!)
e ouvi uma coisa fantástica, um dos atores que sofre de Alzheimer é
questionado por outra personagem o motivo dele não ter plano de saúde e
espantada com a negativa pergunta se ‘e vocês vão ficar dependentes da
caridade?’ ou seja, caridade pública – esse é o SUS para muitos cuja com
a mentalidade de que saúde como um direito não existe! Ela é
filantropia na novela de maior audiência no Brasil. Juro que me
assustei” confessou Amélia.
Para a professora, um dos problemas graves na área da saúde é o da
articulação perversa entre o público e o privado. E que este privado
está “mal acostumado com as benesses do Estado, seja pela isenção de
imposto, seja pela facilidade de importação de tecnologia, seja pela
promoção, criação e ampliação do mercado e eu não preciso chegar no
Eduardo Cunha para isso!”
Engolindo o sapo
Quando abordou o subfinanciamento, Amélia avisou que quando sempre
que fala em gerência, regionalização e redes na área da saúde, precisa
ter cuidado para que isso não se torne mais um “puxadinho do SUS, mais
um instrumento que diante deste subfinanciamento, eu preciso
potencializar os parcos recursos, minha gente, não podemos nos esquecer
do ditado que em época de farinha pouca, meu pirão primeiro!”
Amélia arrematou sua participação evidenciando a grande dificuldade
da gerência cooperativa entre os entes federativos, segundo a
professora, diante da utopia dos anos oitenta o Brasil enfrenta agora
uma distopia, e não é de hoje “nós estamos reativos e cada vez mais
engolindo goela abaixo o sapo da segmentação e da fragmentação do
sistema e da sociedade”.
Saúde na pauta
O presidente da Abrasco Luis Eugenio Souza, falou logo a seguir sobre
as dimensões da gestão e gerência da saúde. Ele questionou em que
medidas os programas de saúde estão efetivamente respondendo aos
problemas da área com estratégias específicas. “A gestão da saúde é de
enorme complexidade e nós vivemos atualmente numa enorme encruzilhada:
no sentido de que a consolidação da saúde segmentada que estamos
assistindo, está dificultando a possibilidade de termos uma gestão
eficiente” criticou Eugenio.
O professor exemplificou com o modelo norte-americano de saúde, este
modelo com multiplicidade de mecanismos de gestão, de mecanismos de
ofertas, de pagamentos, o que torna o modelo dos EUA, num dos sistemas
mais ineficientes e iníquos do mundo. Eugenio seguiu alertando
“obviamente essa é uma tendência que se coloca claramente no brasil,
embora não seja uma tendência inexorável, pois pode e está sendo
combatida pelo movimento social que, inclusive, experimenta os limites
dos planos privados – campeões de queixas em órgãos de defesa do
consumidor e na justiça”.
Mas foi em forma de convite otimista que o presidente da Abrasco
fechou sua participação na Mesa-redonda “é possível que da luta política
pela democracia e igualdade que se desenvolve no país, a gente consiga,
quiçá com o Movimento da Reforma Sanitária, a sintonia mais estreita
com esses movimentos para que a saúde seja de novo incluída na pauta,
como um direito de todos os brasileiros”.
O 4º poder
“Queria dizer antes de mais que é uma honra está aqui nesta mesa ao
lado da minha orientadora Amélia Cohn, e que tudo o que eu disser aqui é
responsabilidade dela!” brincou Gastão Wagner, o último participante da
Mesa-redonda ‘Desafios atuais da gestão da saúde’. Gastão homenageou
ainda dois importantes professores que teve ao longo de sua formação e
que estavam presentes no auditório: Orivaldo Florêncio de Souza e Adolfo
Chorny. “Eu vou compartilhar com vocês uma tese cheia de perguntas,
dúvidas e incertezas. Para mim a saída para a crise do SUS está
articulada à valorização das políticas sociais, das políticas públicas –
está em articular a gestão pública com os valores públicos” afirmou
Wagner.
Pântano
O professor acrescentou ainda que o desafio contemporâneo é
reconstruir um movimento social com projeto do direito à saúde, dentro
do espectro de valorização como política pública. Para Gastão, as
políticas públicas em um país têm valor civilizatória “porque coloca
limite à ganância e à degradação do ambiente, da natureza e das relações
humanas – que o extremismo do empreendedorismo do mercado tem-nos
levado. Sem capacidade de gestão pública para educação, ambiente, saúde:
nós vamos para o pântano, não há saída” alertou o professor.
Gastão evidenciou a luta que precisa ser feita agora “Essa é a briga que
nós temos que fazer. Ou não. Ou vamos aproveitar agora e deixar um
mundo sem horizontes para nossos filhos e netos. Não tem saída, nós
temos que reconstruir as políticas públicas” conclamou. A gestão como um
meio para favorecer a implementação de valores e de interesses foi a
introdução do professor para os questionamentos que deixou para a
plateia “o direito à saúde é um valor? A equidade na saúde é um valor?
Temos que ter estratégias de inventar uma nova gestão que diminua esse
poder do executivo, e inventar um quarto poder – o dos trabalhadores, da
sociedade e dos usuários” finalizou Gastão Wagner.